Educação na Finlândia
Há um bom tempo tem-se falado sobre os ótimos desempenhos da educação na Finlândia. Desde 2000 eles estão entre as primeiras posições do Pisa (Programme for International Student Assessment - Programa Internacional de Avaliação de Estudantes).
O Brasil, em comparação, tem aumentado ligeiramente sua pontuação de 2015 a 2018 (data da última avaliação), mas, de forma geral, se mantém estagnado há mais de 10 anos. Segundo o site Todos Pela Educação, “a pontuação de 2018 coloca o Brasil em 57º em Leitura, 70º em Matemática e 65º em Ciências, dos 79 países e regiões participantes da avaliação. Seguimos bem atrás dos sistemas educacionais mais desenvolvidos e até mesmo de outros países com realidade mais próxima à do Brasil (México e Colômbia, por exemplo)”. Além disso, “A diferença de pontuação entre os alunos brasileiros de maior e menor níveis socioeconômicos aumentou. Essa diferença, que era de 84 pontos em 2009, passou para 97 pontos em 2018.”
Os países que alcançam melhores pontuações, como é o caso de sucesso da Finlândia, apresentam dois pontos em comum: o alto grau de profissionalização e prestígio da carreira dos professores, situação que não ocorre em nosso país, onde o professor é mal remunerado, muitas vezes tem seu salário parcelado, e cada vez mais perde sua autoridade.
Outro dado importante é que há cerca de 500 mil alunos e 50 mil professores na Educação Básica da Finlândia (proporção de 1 para 10), e eles atendem em torno de 24 alunos por turma. No brasil, temos em torno de 2,192 milhões de professores na educação básica, para 57 milhões de alunos matriculados (proporção de 1 para 26), sendo que 87% destes estão em escolas públicas, onde a média de alunos por turma é muito maior que nas escolas particulares, ultrapassando 30 alunos por sala.
Mas eles são um país de primeiro mundo, né, por isso é tudo mais fácil! Mas... a história nem sempre foi assim! Após uma independência tardia (1918), e várias guerras após esse período, fome, altos índices de suicídio, a Finlândia, que possuía uma economia majoritariamente agrária, investiu na educação, especificamente na formação de professores (quem alcança as melhores notas nas seleções como o vestibular é que se tornam professores, além de que é necessário ter no mínimo um mestrado para poder lecionar), deixando o investimento para salas bonitas e recursos diversos para o futuro, quando a qualidade do ENSINO já era algo sedimentado. E assim deu a volta por cima, transformando-se em um dos melhores exemplos que temos na atualidade.
Em resumo, não existe um milagre, mas a criação de políticas e investimentos a longo prazo, de forma consistente, que realizaram grandes mudanças na Finlândia e que inspiram a educação de diversos outros países. Nós, brasileiros, temos como realizar um projeto semelhante, que se adapte à nossa cultura e necessidades, de forma a criar gerações futuras cada vez mais capazes academicamente e que sejam agentes transformadores da sociedade, colocando nosso país na vanguarda de diversas áreas importantes, como a inclusão, saúde, o fim da pobreza, o desenvolvimento tecnológico, novas práticas educativas, etc.
E como é a inclusão na Finlândia?
Eles oferecem oportunidades de aprendizagem igualitárias para todos, esforçando-se para valorizar a individualidade e o desenvolvimento de cada aluno. As reformas da administração escolar reduziram o número de escolas de educação especial e classes de educação especial nas escolas regulares durante as últimas décadas. Isso se deu através de um planejamento que previu, gradativamente, a formação de profissionais e adequação das escolas. Novamente, não existe milagre, mas trabalho duro e constante.
Além disso, eles entendem como dever do município e de cada escola promover a inclusão de seus alunos. A primeira alternativa é sempre de fazer tudo o que é possível para a inclusão na sala de aula regular e, em último caso, quando não houve progresso, os alunos são alocados em classes de educação especial em pequenos grupos de ensino.
Mas não é isso que está sendo implantado no Brasil? Não! A grande diferença em nosso país é que o investimento nas escolas regulares sempre foi precário. Como dito anteriormente, a profissão de professor não é valorizada, tem péssima remuneração, os planejamentos de formação continuada não são uma política nacional efetiva (depende muito da localidade onde a escola/professores estão inseridos), a infraestrutura da grande maioria das escolas públicas necessita de reparos, muitas crianças não têm acesso à creches e educação infantil de qualidade, sendo colocadas em espaços que prezam o cuidado apenas (e olhe lá!). Quando falamos de inclusão a situação é ainda mais assustadora, pois são poucas as escolas que realmente passaram por formação adequada para o atendimento de pessoas com deficiência, e, ainda, quando falamos de transtornos de aprendizagem, muitas crianças não recebem o atendimento adequado (eles nem ao menos são considerados para as salas de AEE – Atendimento Educacional Especializado). Somado a isso, em nosso país o diagnóstico ainda é tardio, especialmente em condições que dependem da observação e entendimento de sinais de alerta para devido encaminhamento, como é o caso do autismo.
Assim, criar escolas especiais (que é um gasto a mais nos cofres da União) não vai resolver o problema da nossa não-inclusão. Pelo contrário, é uma medida segregacionista. Como já comentei anteriormente em um vídeo, não seria mais fácil melhorar o que já temos, antes de criar coisas novas? E com relação aos casos de pessoas com deficiência mais grave, que é sabido que eles não vão conseguir se adequar à escola, eu já participei da equipe terapêutica de 3 famílias que conseguiram aderir ao ensino domiciliar, e o processo não foi tão difícil assim, pois contou com o endosso médico e explicações plausíveis e reais sobre a impossibilidade das crianças em questão de frequentarem a escola regular. Em um dos casos o próprio município enviava profissional para as aulas domiciliares, sem gasto nenhum para a família. Nos outros dois casos, a família optou por profissionais particulares por já existir um vínculo com as crianças e eles gostarem muito do trabalho que estava sendo desenvolvido.
Voltando para o caso da Finlândia, o plano para a inclusão enfatiza a importância de uma ampla rede de educação básica, que apoia o direito de toda criança de frequentar a escola regular mais próxima, o papel central dos professores, que cooperam diretamente com os pais e outros profissionais que atendem o aluno público alvo da inclusão.
O diálogo e trabalho em conjunto é essencial, pois no centro encontra-se o aluno, e se cada um “puxar para um lado”, apenas esse aluno que sai prejudicado, é sobre a vida e o desenvolvimento dele que estamos falando. Aqui, no Brasil, ainda é muito recorrente os profissionais se fecharem em suas salas (tanto terapeutas quanto escola) e se negarem a fazer trocas, achando que se falarem de suas dificuldades serão desqualificados. Porém, se esse processo não for honesto, não tiver trocas verdadeiras, estamos todos nos enganando e ninguém faz o seu trabalho afinal.
Além dessas questões atitudinais, a escola necessita de planejamento (e formação para ser capaz de fazer o seu planejamento). Na Finlândia eles implantaram uma nova forma sistemática de organização do apoio aos alunos com deficiência ou necessidades especiais (incluindo superdotados e pessoas que tenham algum tipo de barreira, como imigrantes que possam ter dificuldade com a cultura, a língua, etc. – incluindo adultos recém-chegados) desde 2010. O foco é fornecer suporte o mais cedo possível para prevenir o surgimento e o crescimento de problemas (olha a educação/intervenção precoce aí, gente). Os alunos são avaliados e suas necessidades identificadas para a criação do planejamento escolar, que pode incluir suporte geral, intensificado ou especial. Todos têm suporte geral, e o apoio intensificado e o apoio especial baseiam-se na avaliação criteriosa e no planejamento de longo prazo em equipes multiprofissionais, com planos de aprendizagem individuais para os alunos.
Podemos perceber que a Educação e a Inclusão não vão ser resolvidas por conta de um governo ou outro, ou uma Lei específica, mas apenas com um projeto de longo prazo, consistente, que considere as especificidades de nosso país (incluindo a falta de verba), e que deve ser transversal a todos os níveis de ensino. Não podemos mudar as regras, os investimentos e o próprio planejamento a cada 4 anos de acordo com a vontade dos governantes (sejam presidentes, governadores ou prefeitos). A educação e a inclusão são maiores que isso, são o nosso legado.
Referências
Agência Brasil: https://agenciabrasil.ebc.com.br/
Global Education Park Finland: https://www.globaleducationparkfinland.fi/
Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira: http://portal.inep.gov.br/
Todos Pela Educação: https://todospelaeducacao.org.br/noticias/pisa-2018/
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